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Como aumentar o apetite por feedback na sua equipe

Qual é o propósito do feedback afinal?
Você já teve aquela sensação de embrulho no estômago, garganta apertada ou mão suando quando estava prestes a entrar numa conversa de feedback? Essas sensações viscerais muito tem a informar sobre o mindset da liderança e da cultura organizacional. Se a experiência de feedback é percebida como negativa, não haverá mudanças positivas.

Mesmo com tantos modelos e ferramentas disponíveis, conversas de feedback são percebidas em muitas organizações como um momento difícil, desconfortável, pois aciona vários gatilhos. Mas não precisa ser assim.

Esse artigo traz insights para fazer jus a palavra feed (nutrir) + back (de volta) para que as pessoas tenham vontade desse processo e, ao invés de embrulharem o estômago, abram o apetite!
O discurso que mais escuto nas empresas foca na importância do feedback como ferramenta para ajudar as pessoas a melhorar a performance e alcançarem os resultados almejados pela organização.

Uma pesquisa da Insperiência (2020) aponta que mais de 50% dos líderes não sabem como dar feedback e 61% dos líderes utilizam feedback somente frente a comportamentos inadequados.

Os parágrafos acima dispararam incongruências dentro de mim. Aproveitei um treinamento recente de liderança para fazer a minha própria pesquisa, observando essa incongruência. Faço isso pela escuta ativa – não só das palavras, mas de todos os sinais do meu corpo.

Te convido a ler, escutar e sentir essas palavras que vieram dos líderes:
Quando dou feedback, lembro da minha avó que dizia “tem que machucar para poder curar”.
Uma vez dei feedback para uma pessoa, ela concordou, mas não fez nada diferente e ainda saiu pela fábrica falando mal de mim.
Um outro colaborador também demonstrou que entendeu, chegou a me dizer “tamo junto”, mas no dia seguinte pediu a conta.

Eu sentia tensão nos ombros aos escutar essas falas. Angústia misturada com tristeza davam dicas de que estávamos numa armadilha. Me coloco junto na armadilha porque ainda não sei ao certo como levar os líderes a experimentar esse novo lugar de feedback que venho acessando: menos foco na ferramenta, mais na aprendizagem contínua e rápida com benefício de mudança tanto para quem dá quanto para quem recebe o feedback.
Ingredientes que estragam o feedback
Esse grupo que virou meu objeto de pesquisa apontou para crenças que estavam instaladas estruturalmente e talvez possam ser generalizadas para todas as organizações que operam em estruturas hierárquicas rígidas, meritocracia e forte comando e controle. Feedback não gerava o impacto desejado porque...
Vinha somente de líder para liderado (top down);
O foco era no negativo, somente quando algo não estava funcionando bem;
Corrigia, reclamava, mas nem sempre saia com construção de soluções;
Era percebido como uma exigência, uma ordem a ser cumprida;
Às vezes era dado em momento de fortes emoções, podendo iniciar um conflito;
Gerava exposição e constrangimento;
O momento era usado para discutir quem estava certo ou errado;
A sensação de quem recebia era de desvalor, medo ou culpa.
Nesse ambiente, onde prevalece a intolerância aos erros, cobrança por perfeccionismo e alta pressão de entrega, posso afirmar que não há segurança relacional para o feedback funcionar. A pessoa sai fragilizada. E isso me leva para o próximo tópico que tem sido o foco de estudo mais instigante dos últimos tempos para mim.
Quando o feedback reforça nossas experiências negativas
O risco das armadilhas citadas acima é disparar os gatilhos dos nossos traumas mais profundos. Não importa se a pessoa reagiu de forma agressiva ou passiva, ela pode entrar em poucos segundos em seus mecanismos de defesa. Esse mecanismo é automático, aprendido bem cedo na vida, as vezes em fase pré-verbal. São mecanismos que ajudam uma criança ou bebê totalmente dependente e vulnerável a lidar com a rejeição, abandono, desvalor, falta de acolhimento ou de amor, realidade mais presente em nossas vidas do que podemos imaginar.

Tudo isso são memórias que ficam instaladas em nosso sistema nervoso, seguimos reagindo a partir delas inconscientemente quando adultos. Qualquer situação que remeta à uma memória de rejeição, abandono, etc., pode disparar um gatilho. O que era para ser uma simples sugestão de melhoria, de repente, fere em um lugar irreparável. A adrenalina é liberada na corrente sanguínea e rapidamente a pessoa entra em estado de alerta e reage como em uma situação de sobrevivência: fugir, atacar, ou congelar (veja um infográfico sobre isso aqui).

O feedback diz mais sobre a pessoa que dá do que sobre quem recebe
Aqui vale diferenciar um feedback sobre um processo, falha técnica ou operacional de um feedback comportamental. Estou focando nesse último, pois é o desafio que quero endereçar. Podemos pensar que o feedback é sobre o outro, mas na verdade, na maioria dos casos, é sobre nós mesmos.

Apontar o defeito do outro é também um mecanismo de defesa para impedir vermos em nós mesmos o que é difícil de aceitar. Daí, quando vemos essa qualidade no outro, fica gritante o incômodo e tendemos a ficar mais reativos.

De nada ajudam as ferramentas de feedback se não entendermos que o que vemos de “defeito” na outra pessoa passa por filtros e vieses inconscientes que interferem radicalmente no significado que atribuímos ao que observamos.

"Não vemos as coisas como elas são, mas como nós somos.“

Anaïs Nin¹
Da mesma forma, quando damos um feedback positivo, comunicamos algo sobre nós: escolhemos perceber a outra pessoa pelos seus pontos fortes. Estudos do Gottman Institute2 afirmam que as relações mais bem sucedidas têm uma proporção de 5 vezes mais apreciações do que críticas, porém, nosso processo educativo muitas vezes inverteu essa proporção.
Como criar confiança e abertura para dar feedback
"O feedback não precisa ser uma fonte de medo, ele pode abrir espaço para uma nova emoção, para a alegria de saber que podemos fazer algo de forma diferente."

Joe Hirsch
Ao invés de querer mostrar que o outro está errado, “consertar” alguém ou apontar dedos, como seria uma cultura que aponta possibilidades de aprendizagem e incrementos de melhoria no sistema o tempo todo?

O primeiro passo é a construção de um ambiente com segurança relacional (ou segurança psicológica - (leia mais sobre isso aqui).

Esse primeiro ponto é base para os próximos poderem acontecer:

Mesmo dentro de uma hierarquia, pode-se estabelecer senso de igualdade e o feedback ser dado em todas as direções, não só de líder para liderado;
Trabalhar a escuta empática e atenção generativa desarma os mecanismos de defesa e nos permite escutar a real experiência da pessoa com o processo e saber como ela se sente com a gente;
Oferecer e pedir feedback em ambiente tranquilo, jamais em público, exceto se foi um acordo de grupo;
Estar tranquilo, livre de fortes emoções – saber se autorregular emocionalmente regula também as pessoas ao seu redor;
Somente dar feedback se tiver permissão – respeitar que há pessoas que não querem receber feedback ou não naquele momento;
Olhar para o que está funcionando bem na mesma proporção do que o que está funcionando mal faz o nosso cérebro absorver melhor a informação crítica e o sistema nervoso relaxar.
Sempre fechar um feedback com uma apreciação – focar nas qualidades do ser humano fortalece, aumenta a autoestima e também as chances de resolver o problema. Note que apreciação é diferente de elogio. Aqui um post legal sobre isso.

Alguns desses pontos é a exata proposta dos Dez Componentes para criar um Thinking Environment (Ambiente para Pensar): criar conexão, relações de confiança. Você pode ler mais sobre isso aqui.

Um outro processo que utilizo muito é o feedback loop da teoria U3. Ele serve bem quando estou fazendo algo pela primeira vez, porque revela o que está escondido no sistema e pode se manifestar a partir da minha própria percepção ou da de outras pessoas.

O convite é primeiro de autoavaliação:

O que mais me marcou positivamente nessa experiência?
Onde fui pega de surpresa ou tive dificuldade?
O que vale a pena repetir porque deu certo?
O que eu faria diferente para melhorar numa próxima vez?
Depois, as mesmas perguntas podem ser feitas, mas trazendo a perspectiva de alguém que trabalhou comigo ou me observou de fora. É quase como uma entrevista que eu mesma posso perguntar:
O que mais lhe marcou positivamente nessa experiência comigo?
Onde você me viu com dificuldade?
O que você observou que deu certo?
O que você sugere que eu faça diferente para melhorar ou poderia sugerir para eu lidar com essa dificuldade?
Essas perguntas fazem com que eu veja a mim mesma e meu impacto no sistema com senso de pertencimento. Elas facilitam enxergar meu ponto cego, o que preciso “deixar ir”, coisas que não funcionam mais dos meus hábitos e comportamentos para deixar aflorar uma nova forma de operar e incrementar o sistema como um todo.

E aqui, é só celebrar! Porque a aprendizagem ao fazer esses diálogos de feedback dispara serotonina4 na corrente sanguínea, ao invés de adrenalina5. E quem não vai querer se nutrir (feed) de um prato delicioso e quentinho assim? De novo e de novo (back)?

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