Nunca se falou tanto de Burnout. O tema está em capa de revista, jornal, artigos científicos e nas mídias sociais. Mas o que significa isso exatamente? Qual o custo disso para as empresas? E porque esse tema não é interessante só para psicólogos e médicos, mas também para líderes.
Acompanho na Alemanha a palestra de Daniela Blickhan, psicóloga e coach há 25 anos, que aborda o tema “Florescer ao invés de se esgotar” com estatísticas atuais alarmantes sobre depressão e burnout. A boa notícia é que o burnout é só um lado da moeda. Do outro lado está a possibilidade de um florescer, e isso se pode aprender, também nas organizações. Eu passei por isso, conheço muita gente que passou. Ainda é um tema estigmatizado. Proponho criarmos espaços para falarmos mais abertamente sobre ele.
Daniela começa convidando para avaliar: Como está o dia a dia em seu trabalho?
Todos com um smartphone nas mãos (ou mais), um tablet, o laptop aberto, a tentativa constante de ser multitarefa, as demandas sempre urgentes, a complexidade só aumentando. Nesse cenário, alguns dados também aumentaram.
(Dados do sistema de seguros obrigatórios de saúde da Alemanha, 2012).
Daniela nos chama atenção para diferenciar depressão de burnout, pois normalmente são falados como se fossem a mesma coisa. Burnout, em estágios mais avançados, tem sintomas parecidos com a depressão, mas nessa última os sintomas são cíclicos, vão e voltam, e representam uma carga psicológica pesada que aumenta se não for tratada. Burnout não é considerado uma doença, mas um estado de esgotamento físico e mental.
Entre os anos de 2007 – 2011, em apenas 4 anos, o consumo de antidepressivos duplicou na Alemanha. Um dado tão difícil de digerir quanto os próprios medicamentos. A OMS (Organização Mundial da Saúde) previa que, até 2020, a depressão seria a segunda doença mais comum do mundo.
Não se trata mais de endereçar casos individualmente, mas de desenvolver um olhar sistêmico e trabalhar com grupos, equipes e toda a organização para mudar a cultura em torno do tema.
Esses são números da Alemanha, mas há um padrão parecido em outros países como Áustria, Inglaterra e Estados Unidos.
Ainda as terapias cognitivo-comportamentais tem sido as mais indicadas. Porém, há limitações a se considerar. Martin Seligman, psicólogo especialista em tratamento de depressão, desenvolvendo, aplicando e treinando pessoas em uma das terapias mais conhecidas na Alemanha, vem observando em seus últimos anos de prática que, depois do tratamento:
“Tratei a depressão e ganhei um paciente vazio” (I’ve got an empty patient).
Ele observou que um paciente sem depressão pode ainda não estar em contato com sua capacidade de florescer e exercer seu máximo potencial. Daí seu livro dando sequência às suas novas descobertas se chamar Flourish (Florescer). É importante o paciente não ter mais um diagnóstico de depressão, mas há indícios de que, mesmo doente, há possibilidades de um paciente florescer.
Com esse termo “florescer”, Kies explica que, mesmo estando em algum estágio de adoecimento por depressão, a pessoa pode encontrar um estado psíquico de bem-estar caracterizado por:
A partir dessas bases nasceu a psicologia positiva. Mas Karl Rogers já sabia disso mesmo antes com sua psicologia humanística centrada no cliente: “Werde wer du bist” (Torne-se quem você é).
O termo florescer vem da botânica. Com rega, adubo e sol, uma planta pode florescer. Mas como “regar” e “adubar” pessoas?
Essa tríade é decisiva para um desenvolvimento humano positivo. Daí o interesse crescente na psicologia positiva. Impulsos por seminários, coaching, mentoria podem ajudar, mas precisa estratégia para sustentar.
Ao trabalhar nas empresas, Daniela relata ter tido mais ressonância ao evitar colocar a palavra “burnout” em seus workshops e programas. No lugar de chamar de “Workshop Anti-burnout”, ela passou a dar um título suave como “Workshop de Forças e Talentos”. O treinamento de liderança chamou de “Be your Best” (Seja o seu melhor).
Há evidências científicas que quando o líder foca nas forças ao invés de focar nas fraquezas, o time melhora seu desempenho (busque estudos do Gallup sobre isso).
As pessoas também respondem melhor quando são motivadas por valores vividos. É destrutivo para a motivação ter missão, visão e valores pendurados na parede e que não são vividos.
Entrar em flow (fluxo) é possível também no trabalho, mesmo que a maioria associe flow à vida pessoal, é um mecanismo natural contra estresse que pode ser acessado a qualquer momento. Flow é um estado que libera oxigênio no cérebro e o corpo sai do estado de alerta. A pergunta é: como construir momentos de flow no dia a dia do trabalho? Quem está em flow está no ápice de seu desempenho. Ter suas necessidades psicológicas básicas atendidas é uma forma de impulsionar esse estado.
Mas não há como fazer isso artificialmente. O que mais faz as pessoas entrarem naturalmente em estado de flow é seu posicionamento perante o trabalho.
A recomendação de Daniela é que todos os líderes passem por programas de treinamento e coaching para tomarem consciência de seus propósitos e ressignificar porque trabalham. Os próprios líderes podem fazer isso e depois, permear nas equipes.
Treinamentos que promovem incorporar novos hábitos tem melhor resultado quando os participantes encontram um parceiro de aprendizagem para estabilizar esses hábitos. Quando ensinamos em nossos treinamentos os processos de escuta generativa com o Thinking Environment ou Teoria U, sugerimos que uma a duas vezes por semana colegas se encontrem para se apoiarem em seus objetivos. Só o fato de uma pessoa falar de seus objetivos e ter alguém que escuta aumenta a probabilidade de alcançar esse objetivo.
Para aumentar as chances de ampliar esses treinamentos, Daniela sugere fazer medições e pesquisa com participantes antes, durante e depois do curso (2 meses mais tarde e com grupos de controle 6 meses ou mais). Alguns parâmetros que ela mediu com sucesso:
Se os efeitos forem verificados após 2 meses, é provável que irão perdurar. A pesquisa de Daniela verificou que a curva de depressão nas empresas onde atuou caiu drasticamente só com o coaching. Em todos os parâmetros positivos houve mudança significativa.
Em resumo, florescer pode-se aprender. É um processo de aprendizagem que pode ser impulsionado pelo indivíduo ou pela empresa.
Esses 2 pontos acima são receitas para depressão.
Informações e relatos extraídos parcialmente da palestra de Daniela Blickhan “Aufblühen statt Ausbrennen” no Congresso "Positive Psychologie" in Rosenheim, Alemanha, 05.- 06. Juli 2014, reproduzida online pelo Auditorium Netzwerk em Abril 2022 (https://shop.auditorium-netzwerk.de/custom/index/sCustom/727)